Tesouros do cerrado: Chapada dos Veadeiros (GO) abriga espécies de abelhas que não existem em nenhum outro lugar do mundo

Texto por Conexão Press

Estudo liderado pela UnB revela riqueza única da fauna local e alerta para risco iminente de extinção de espécies

Você sabia que existem espécies de abelhas que só existem na Chapada dos Veadeiros, em Goiás? Um projeto pioneiro está mapeando e monitorando sistematicamente as espécies de abelhas da região, considerada uma das áreas de maior relevância biológica do Cerrado brasileiro. A iniciativa, encabeçada pelo professor Antônio Aguiar (UnB) dentro do projeto Rede Biota Cerrado financiado pelo CNPq, busca identificar as espécies nativas, avaliar o tamanho das populações e acompanhar as transformações ambientais que podem colocar esses insetos em risco de extinção.

A espécie Schwarziana chapadensis, identificada nas proximidades do Rio São Miguel, é um inseto de distribuição extremamente restrita, encontrado apenas naquela área específica, que inclui a cachoeira do Cordovil e o Vale da Lua.

Segundo o professor Antonio Aguiar, do Departamento de Zoologia da UnB, a Chapada dos Veadeiros (GO) concentra espécies únicas de abelhas, como a Schwarziana chapadensis, Caupolicana Gaullei dentre outras, que só existem em altitudes elevadas da região. “A mudança climática provavelmente vai levar à extinção de algumas dessas espécies. É quase certo que isso vai acontecer”, alerta. “Então a gente precisa monitorar para evitar que isso ocorra de forma acelerada ou tentar salvar, mantendo as populações naturais e as áreas preservadas”, explica.

As abelhas nativas são consideradas organismos-chave nos ecossistemas por sua função polinizadora e por manterem interações complexas com as plantas do bioma. O projeto atua na formação acadêmica, com coleta de abelhas em campo junto a estudantes, armazenamento de exemplares na coleção entomológica da UnB e extração de DNA para análise genética das populações. O objetivo é entender se essas populações estão crescendo, se estão isoladas ou conectadas com outras, e como estão respondendo às mudanças ambientais. Os estudos dos pesquisadores vêm sendo realizados no Santuário Fazenda Volta da Serra, que desenvolve pesquisa científica há mais de 20 anos.

Região rica em biodiversidade


Localizada entre os municípios de Alto Paraíso, Cavalcante e Teresina de Goiás, a Chapada dos Veadeiros (GO) é considerada por Aguiar uma área de alta relevância biológica mundial. “Esse é um patrimônio da humanidade. São campos rupestres que levaram milhões de anos para se estabilizar e, em poucas horas, podem ser destruídos por um trator. Uma área natural não se restaura em décadas. Leva centenas de anos”, ressalta o pesquisador.

A ocupação desordenada, o avanço de áreas urbanas e o uso indiscriminado de agrotóxicos têm contribuído para o desaparecimento de abelhas em todo o Brasil, como reforça Lauro Jurgeaitis, presidente da Associação Veadeiros. “Existe uma lista do Ibama que mostra espécies como a Uruçu em risco de extinção, e isso se deve principalmente à supressão do habitat e ao uso de agroquímicos”, afirma.

Jurgeaitis também destaca o papel estratégico da apicultura e meliponicultura na conservação ambiental. “É uma das atividades mais sustentáveis que existem. Aqui na Volta da Serra, por exemplo, temos uma diversidade impressionante de abelhas em uma área de apenas dois mil hectares. Isso mostra o quanto a Chapada dos Veadeiros ainda é rica e equilibrada”, diz.

Produção sustentável


A região, que já atrai pesquisadores e estudantes de todo o Brasil, também aposta na produção de mel como alternativa econômica aliada à preservação. “O mel do cerrado tem características únicas, com floradas como a da arueira e da cipaúba, que produzem sabores e composições diferenciadas. Estudos mostram, inclusive, que o mel da arueira combate a bactéria H. pylori*, conta Jurgeaitis.

Com o inventário e o monitoramento contínuo das espécies, os pesquisadores esperam criar estratégias para frear a mudança da paisagem e o desaparecimento das abelhas para promover uma convivência mais equilibrada entre as comunidades humanas e a biodiversidade da Chapada dos Veadeiros. “Estamos atuando num processo acelerado de extinção. Preservar essas abelhas é preservar toda uma rede de vida que depende delas”, conclui o professor Aguiar.